23 novembro 2010

Paul McCartney - O Primeiro Show


A expectativa era grande. Desde que ouço e me viciei em Beatles, há pouco mais de 12 anos, espero ansiosamente por uma oportunidade de ver Paul McCartney ao vivo. Confesso que já estava sem esperanças de vê-lo no Brasil, e acompanhava com frequência diária por quais cidades passavam suas turnês (a maioria era nos EUA mesmo... malditos sortudos!).


Para minha surpresa, os rumores de 2010 estavam se tornando, pela primeira vez, realidade. Antes de ficar animado, a sensação foi de angústia. Será que conseguiria o ingresso que eu queria de fato? Será que haveria apenas uma apresentação em São Paulo? Será que eu conseguiria viajar pra Porto Alegre para acompanhar toda sua passagem pelo país?


Por motivos que me fugiam do controle (estava em negociação para mudar de emprego), não pude ir a Porto Alegre. Só me restava esperar e torcer para que tudo desse certo aqui e que confirmassem mais uma apresentação (já havia rumores também).


É o dia anterior ao anunciado para venda de ingressos. Entro no site de vendas e fico esperando desde às 21h, atualizando-o de minuto em minuto. Como era esperado, a venda foi aberta minutos antes da meia-noite (quase 15 minutos!). Obviamente havia gente que sabia disso. Foi de um desrespeito absurdo para quem não previu tamanha desonestidade. De qualquer maneira, eu estava vacinado. Tive que comprar ingressos para shows do ano passado e acontecera o mesmo. Saí clicando correndo e consegui ingressos para a pista Prime, no valor de 700 reais (+ taxas de “conveniência”... sim, 16% para se retirar no estádio e 20% para entrega em domicílio. Uma verdadeira exploração!) a unidade. Um amigo meu que entrou junto comigo não conseguiu efetuar a compra. Ou seja, em questão de pouquíssimos minutos estava tudo esgotado... ou, pelo menos, era o que achávamos... dias depois, liberaram outro lote, e ele pôde comprar num setor razoável. Soubemos depois que, sem divulgação nenhuma, liberaram mais 300 ingressos, com retirada apenas no estádio do Morumbi, para quase todos os setores. Outro desrespeito com os fãs. De onde surgiram esses ingressos? Por que fazer “lotes” – com exceção, claro, das cadeiras cativas que não foram vendidas... isso é compreensível – e liberar sem aviso prévio? Quem é que sabe os horários que disponibilizam esses ingressos? É preciso fazer parte dessa mafiazinha de desonestos para conseguir com tranquilidade um par de entradas? Prefiro ficar sem ingresso! Antes alguma dignidade. Mas ninguém liga. Quem quer se dar bem, entra na dança. Quem não quer e não concorda, normalmente não reclama. Esse é o perfil desse povo.


Fui retirar os ingressos com algum receio. Havia notícias de lotação e assaltos nos arredores do Morumbi. Para minha surpresa, quando cheguei não havia ninguém retirando (literalmente! Era só eu!).


É o dia do show. Combinei com um taxista, dois dias antes, para nos pegar em casa e levar-nos ao estádio. Chegamos lá por volta das 15h30 (o show estava marcado para às 21h30). Desnecessário dizer que já existiam filas quilométricas nos portões. Esperamos debaixo de um Sol de 30 graus até a abertura dos portões, às 17h30.


A desorganização era total. Ninguém sabia onde começava e terminava a fila, e pra qual setor que era. Não era uma fila única... ela era gorda, com 4, às vezes 5 pessoas atravessadas. Além da desorganização geral (vi apenas um orientador tentando organizar a bagunça, em vão), a cultura do nosso povo também não ajuda em nada. Vários “espertos” tentavam – e conseguiam – furar. Na minha frente apareceu, sem a menor cerimônia, um cabeludo com um bigode ridículo (há bigodes e bigodes... o dele era realmente ridículo). E o que aconteceu? Nada! Ou quase nada! Não permiti que ele ficasse ali, claro. Disse que estava ali desde às 15h30, e quem chegou com ele (17h), estava lá atrás. Com a cara mais lavada do mundo, ele se “surpreendeu”: “Poxa vida, é mesmo?”. Sim, é mesmo. Ele “saiu” da fila, mas entrou imediatamente atrás de mim. O pessoal que ali estava não reclamou, e ele economizou um bom tempo desonestamente. Cinco minutos depois, chega um grupo do Rio de Janeiro e ficou esperando, ao meu lado, uma chance de furar. Eram 3 homens e uma senhora de uns quarenta e poucos anos. Conseguiram furar na frente... do cabeludo!!! Óbvio que o cabeludo nem ligou, já que estava ali ilegitimamente. Até começaram um papo descontraído, como se não tivessem feito nada de mais. A fila começa a andar pra valer agora. Mais à frente existem grades onde furar fila torna-se impossível (deveria haver esse tipo de proteção durante todo o percurso, não somente ali). Centímetro antes dessa entrada, mais um pessoal tenta passar a nossa frente (um grupo grande, de umas 5 pessoas). Fechamos a porta. Adivinhou onde eles conseguiram entrar? Na frente dos cariocas! Chegaram 17h30 e ficaram no lugar de quem chegou duas horas antes.


Enfim, após a revista policial, entramos no estádio. Os sentimentos se misturam... alegria por tudo ter dado certo até aquele momento, êxtase em ver que o palco está tão perto, e angústia para a apresentação começar logo (faltavam 4 horas ainda!). Felizmente conseguimos sentar no chão. De hora em hora, mais ou menos, o pessoal dava uma empurrada, então a gente levantava, ia um pouco mais pra frente, e sentava novamente. Enquanto isso, colocaram um DJ no palco para passar o tempo. Era melhor que não tivesse nada. Além das músicas não fazerem o menor sentido com o contexto daquele dia, a qualidade de som era sofrível.


Eram 21h. Todos já estavam de pé, apreensivos para ver o Paul entrar em palco. Segundo meu relógio, ele entrou exatamente às 21h33. Pontualidade britânica, diferente das bandinhas nacionais, que atrasam horas. Paul já entrou falando em português, agradecendo todo mundo e começou a tocar. A qualidade de som era impressionante. Parecia que eu havia colocado um fone de ouvido e escutava meu iPod na sala de casa.

A segunda música é “All My Lovin’”, e gera uma apoteose coletiva. Todos cantando a plenos pulmões. A 30 metros do palco dá pra ver tudo em detalhes, e o telão é mero enfeite. Para melhorar, logo veio “Let me roll it”.


As músicas do repertório estão abaixo. Não vou citar todas, mas algumas foram muito marcantes.


Quando Paul foi pro piano, não surpreendeu tocar as belas “The Long and Winding Road” e “My Love”, falando em português que escrevera essa última para sua “gatinha” Linda, mas que, naquela noite, era pra todos os namorados.


Duas homenagens muito emocionantes foram “Something” e “Here Today”. Na primeira, Paul começa sozinho e há imagens, na tela que fica atrás do palco, dele com George. Na metade da música, a banda toda entra, e é uma sensação que apenas ele conseguiria oferecer. Em “Here Today”, é difícil ver, do lugar onde estou, quem não foi às lágrimas. É impossível não se emocionar com a homenagem a John (houve outra homenagem a ele, "A Day in the Life" emendada com "Give Peace a Chance").


Depois disso, para levantar o ritmo e descontrair, nada melhor do que colocar o Abe, baterista-figura há muitos anos com o Paul, para dançar “Dance Tonight”. As atenções são todas dele nessa hora.


Houve, também, algumas surpresas. Pelo menos não esperava ouvir “Ob-la-di Ob-la-da”, “Let'Em in” e "And I Love Her".


A cada final de música, quando o Paul dava 5 segundos de espaço, a plateia cantava o refrão da última música. Em duas delas, Paul deu “trela” e levava bem baixinho no contrabaixo, estimulando todo mundo.


A penúltima música ante do bis é sempre muito esperada, tanto por ela, em si, como pelos efeitos pirotécnicos. "Live and Let Die" levanta até defunto! Como estava perto do palco, deu pra sentir o forte calor das explosões. Fiquei imaginando como os músicos se sentem nessa hora!


Houve 2 bis. Na primeira saída, o pessoal cantava “We love you, yeah, yeah, yeah” e “I don´t know why you say goodbye I say hello”. Na segunda, “Get back to where you once belonged”.


Ao final da última música, de fato (Sgt Peppers/The End), Paul ficou alguns minutos sozinho no palco agradecendo ao público e fazendo graça. Fez tanto que, ao final, levou um tombaço quando tropeçou na caixa acústica de retorno. Mas não foi nada de mais. Levantou-se e fez mais graça.


Em suma, é impressionante ver como, aos 68 anos, Paul McCartney continua em plena forma. Canta, toca, dança e anima o público. Um verdadeiro show-man. Um profissional com “P” maiúsculo. E um repertório que dispensa apresentações. Apesar de toda falta de organização e pessoas que não se respeitam, nas filas e na pista, foi bom ter participado desse momento histórico e, para muitos, único.